O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, deixou por volta das 15h45 nesta quinta-feira a sede da Polícia Federal para prestar um novo depoimento no âmbito do inquérito da trama golpista, que apura um plano cujo objetivo era manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após a derrota nas eleições de 2022. Segundo sua defesa, ele respondeu a todas as perguntas. O interrogatório durou cerca de uma hora e quarenta. O caso está no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Valdemar foi indiciado no mês passado junto com o ex-presidente e outros 35 homens por tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de direito e organização criminosa. Ele deve ser questionado pela polícia sobre a ação que buscou questionar a lisura do processo eleitoral.
A PF apontou no relatório final que Valdemar e Bolsonaro agiram de maneira dolosa — ou seja, com intenção — ao peticionar na Justiça Eleitoral um relatório pedindo a invalidação dos votos de milhares de urnas.
"Os investigados tinham plena ciência de que os 'argumentos técnicos', que serviram de fundamento para a ação, eram falsos, não provando qualquer fraude ou irregularidade no sistema das urnas eletrônicas, que desacreditasse o pleito realizado em outubro de 2022", pontuou a PF.
Após a derrota de Bolsonaro em 2022, o PL entrou com uma ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na qual pedia a anulação de parte dos votos das eleições de 2022. A investigação da PF aponta que o PL foi usado “para financiar a estrutura de apoio às narrativas que alegavam supostas fraudes às urnas eletrônicas, de modo a legitimar as manifestações que ocorriam em frentes as instalações militares".
Segundo a PF, o ápice da estratégia ocorreu no dia 22 de novembro de 2022, quando a coligação formada pelo PL, Republicanos e Progressistas entrou com uma ação que, na prática, anularia votos de urnas utilizadas nas eleições daquele ano. Sobre isso, a PF aponta que apesar de o questionamento formal sobre as urnas ter partido da coligação, Valdemar era o "principal fiador dos questionamentos".
Conforme a PF, dentro da divisão de tarefas estabelecidas por um dos núcleos da organização, chamado de "núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral", coube a Valdemar Costa Neto "financiar, divulgar perante a imprensa e endossar a ação judicial que corroborava a atuação da rede de ‘especialistas’ que subsidiaram ‘estudos técnicos’ que comprovariam supostas fraudes nas eleições presidenciais de 2022”.
Segundo os investigadores, o antigo comitê da campanha de Bolsonaro, alugado pelo PL, chegou a ser usado por investigados. O local, de acordo com a PF, ficou conhecido como "QG do golpe", pelo fato de ter sido frequentado, após o término do segundo turno das eleições, "por diversos apoiadores do então presidente Jair Bolsonaro entusiastas de uma intervenção militar das Forças Armadas que resultaria na continuidade do então presidente no poder".
Valdemar deixa a PF depois de quase duas horas de depoimento no inquérito do golpe
Presidente do PL, Valdemar Costa Neto é um dos indiciados na investigação sobre uma tentativa de golpe de Estado. Ex-assessor de Bolsonaro e juiz também foram ouvidos.
Por Isabela Camargo, Fábio Amato, TV Globo e GloboNews — Brasília
O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, deixou no meio da tarde desta quinta-feira (12) a sede da Polícia Federal, em Brasília, onde prestou depoimento no inquérito que investiga a organização de um golpe de Estado impedir a posso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, eleito em outubro de 2022.
Valdemar chegou à PF por volta das 14h e saiu do local por volta de 15h50. Ele não falou com a imprensa.
O ex-presidente Jair Bolsonaro, também investigado no inquérito, é do partido de Valdemar.
Além do presidente do PL, prestaram depoimento nesta tarde:
- o ex-assessor do ex-presidente Jair Bolsonaro, Marcelo Câmara;
- e o juiz federal Sandro Nunes Vieira, afastado do cargo pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Segundo o relatório da PF, Valdemar Costa Neto é acusado de apoiar e financiar questionamentos à integridade das urnas eletrônicas e teve um papel central na propagação de dúvidas sobre o sistema eleitoral.
Já Marcelo Câmara, coronel da reserva, é apontado como um dos principais disseminadores de narrativas golpistas e participante ativo nas articulações para reverter os resultados das eleições de 2022.
O advogado Luiz Eduardo Kuntz, que representa Marcelo Câmara, afirmou que o cliente respondeu a todas as perguntas e que o depoimento foi "tranquilo". "O coronel Câmara, na verdade, é uma testemunha importante dessa nova investigação", declarou.
Sandro Nunes Vieira atuou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2019 até agosto de 2022. Segundo a PF, o juiz atuou "de forma ilegal e clandestina" ao assessorar o PL na elaboração de um documento com acusações infundadas contra as urnas eletrônicas.
O indiciamento pela PF indica que a corporação viu fatos suficientes para considerar a participação de Bolsonaro e seus ex-auxiliares na trama golpista.
O relatório com os indiciamentos foi apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF), e o ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, deve enviar o material para análise da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Se a PGR entender que há elementos suficientes, poderá oferecer uma denúncia à Justiça contra os envolvidos. Caso a denúncia seja acolhida pelo STF, Bolsonaro e seus auxiliares se tornarão réus.
Mais três indiciados
Inicialmente, a PF havia indiciado 37 pessoas. Nesta quarta, anunciou o indiciamento de mais três, todos militares.
- Aparecido Andrade Portella — suplente da senadora Teresa Cristina (PL-MS), que foi ministra da Agricultura no governo Jair Bolsonaro.
- Reginaldo Vieira de Abreu
- Rodrigo Bezerra de Azevedo
Entenda a participação de cada um, segundo a PF:
- Aparecido Andrade Portela
Aparecido Andrade Portela, militar da reserva e suplente da senadora Tereza Cristina (PL-MS), é acusado pela Polícia Federal de ser um intermediário entre o governo de Jair Bolsonaro e financiadores das manifestações antidemocráticas. Ele visitou o Palácio da Alvorada ao menos 13 vezes em dezembro de 2022, reforçando sua proximidade com Bolsonaro, com quem serviu em Nioaque (MS) nos anos 1970.
Portela utilizava o codinome “churrasco” em mensagens trocadas com Mauro Cid para se referir ao golpe de Estado. Ele mencionou que financiadores estavam cobrando a execução da “ruptura institucional” após contribuírem com recursos, referindo-se a esses valores como “colaboração da carne”. Além de arrecadar fundos, Portela sugeria estratégias de atuação para o movimento golpista e demonstrava preocupação em não ser identificado como organizador dos atos criminosos de 8 de janeiro de 2023.
Mensagens enviadas a Mauro Cid incluem prints de publicações pedindo informações sobre golpistas, evidenciando seu receio. Ao ser ouvido pela PF, Portela exerceu o direito ao silêncio. No entanto, os investigadores destacam que suas mensagens e visitas frequentes ao Palácio da Alvorada indicam sua participação ativa na organização dos atos golpistas.
- Reginaldo Vieira de Abreu
Reginaldo Vieira de Abreu, coronel do Exército e chefe de gabinete do então secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, Mário Fernandes, é acusado de disseminar desinformação sobre o sistema eleitoral. Ele chegou a levar um hacker à sede da PF em Brasília para tentar formalizar denúncias falsas contra as urnas eletrônicas.
A investigação aponta que Vieira manipulou relatórios das Forças Armadas para alinhá-los com as informações falsas divulgadas pelo argentino Fernando Cerimedo. Ele usava o termo "rataria" para referir-se aos participantes das reuniões clandestinas e defendia que o relatório fosse "no mínimo, alinhado" com as mentiras divulgadas. Vieira também teria repassado informações sobre o deslocamento do ministro Gilmar Mendes em novembro de 2022, período em que foi elaborada a minuta do golpe que previa a prisão do ministro.
A PF identificou que Vieira imprimiu um documento intitulado “Gabinete de Crise” no Palácio do Planalto, que seria utilizado para assessorar Bolsonaro após a concretização do golpe. Como Portela, Vieira optou por permanecer em silêncio durante seu depoimento.
- Rodrigo Bezerra de Azevedo
Rodrigo Bezerra de Azevedo, major do Exército e integrante do Comando de Operações Especiais (Copesp), é acusado de integrar o núcleo operacional do plano de assassinato do ministro Alexandre de Moraes. O codinome “Brasil” foi associado a um número de telefone que ele utilizava para ações clandestinas.
A análise de dados telefônicos revelou que aparelhos vinculados ao codinome "Brasil" estavam próximos à residência de Azevedo em Goiânia após a data da tentativa de assassinato, evidenciando sua conexão com a operação criminosa. Ele admitiu ter utilizado celulares e chips anonimizados, prática comum em missões sensíveis do Exército.
A PF encontrou ligações feitas por Azevedo para contas bancárias abertas fraudulentamente em nome de terceiros. Um desses números estava cadastrado no aplicativo Signal no celular do general Mário Fernandes, evidenciando vínculos com outros integrantes da organização criminosa. Azevedo alega que o celular usado na ação foi encontrado em uma sala do Copesp e que ele o utilizou sem saber de seu envolvimento anterior. Ele afirmou que o dispositivo quebrou em 2023 e foi descartado, mas a PF considera que as evidências demonstram seu envolvimento direto no plano golpista.